Marina Silva critica proposta de tirar demarcação de terras do Ministério dos Povos Indígenas: ‘um dos piores sinais’

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Marina Silva. Foto: Carla Carniel- Ag Reuters

Ministra do Meio Ambiente deu a declaração na Câmara. Mudança está prevista no relatório da medida provisória que reestrutura os ministérios e foi aprovada por comissão nesta quarta. Texto vai aos plenários da Câmara e do Senado.

Em audiência na Câmara dos Deputados, a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, criticou nesta quarta-feira (24) a proposta de retirar a gestão de demarcação de terras indígenas do Ministério dos Povos Indígenas, chefiado por Sônia Guajajara.

👉 Contexto: A mudança está prevista no relatório do deputado Isnaldo Bulhões (MDB-AL) sobre a medida provisória que reestrutura os ministérios. Pelo texto, essa atribuição voltaria a ser do Ministério da Justiça. Nesta quarta, o parecer foi votado e aprovado na comissão mista que analisa a MP. O texto vai ainda passar pelos plenários da Câmara e do Senado.

É algo que é um sinal, um dos piores sinais. São 500 anos de história em que nós decidimos o que fazer para nós mesmos. Estamos dizendo que os indígenas não têm isenção para fazer o que é melhor para eles mesmos em relação à demarcação de suas terras. — Marina Silva, ministra do Meio Ambiente

Isenção


A ministra disse ainda que os ministérios agem de “acordo com a lei” e ressaltou que, segundo a lei, eles têm isenção para ter essa responsabilidade.

“Se o critério é que os que defendem meio ambiente não tem isenção para defender meio ambiente com os órgãos de meio ambiente, se dizem que quem é indígena não tem isenção para cuidar dos órgãos que cuidam dos povos indígenas, daqui a pouco vai se fazer uma lei para dizer que o Ministério da Fazenda não tem isenção para ficar com a Receita Federal”, disse.
Marina Silva destacou que o Ministério dos Povos Indígenas não vai demarcar terras se não estiverem conforme a lei.

“A questão é que nós agimos, mas agimos de acordo com a lei […] A Soninha Guajajara não vai demarcar terra indígena invadindo terras que não estejam de acordo com a lei”, concluiu a ministra.

O que diz o relator
Em entrevista à GloboNews, o relator da MP contestou a declaração de Marina Silva : “está se posicionando fora de contexto”.

Segundo Isnaldo Bulhões, a transferência da política de demarcação para o Ministério da Justiça busca dar “imparcialidade” aos processos.

Como é o processo de demarcação de terras
A demarcação de uma terra indígena envolve uma série de processos que incluem a análise da demanda da população indígena, a delimitação do território físico e o registro da terra indígena em cartório.

A Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), hoje vinculada ao Ministério dos Povos Indígenas, é responsável por todo esse trâmite – e, uma vez demarcadas, pela fiscalização e pelo monitoramento dos indígenas que vivem nesses territórios.

Até 2022, todo esse trâmite ficava a cargo do Ministério da Justiça, ao qual era vinculada a Funai.

Veja abaixo, em linhas gerais, as etapas que envolvem a demarcação de uma terra indígena:

Identificação: técnicos da Funai, junto com a comunidade indígena, identificam a área, fazem uma proposta de delimitação e analisam possíveis contestações ao território.
Declaração: o Ministério dos Povos Indígenas analisa a proposta elaborada pelo grupo de trabalho e já aprovada pela Funai. Se a resposta for positiva, o povo indígena recebe a posse permanente das terras. Se for negativa, o processo volta à etapa inicial.
Demarcação: nessa etapa, o governo aplica no território a delimitação física do que foi definido por portaria – ou seja, instala estruturas como marcos, placas indicativas e cercas.
Homologação: um decreto federal, assinado pelo Presidente da República, confirma a demarcação da terra indígena e oficializa o status de proteção da área.
Registro: a terra indígena é registrada em cartório de imóveis e na Secretaria de Patrimônio da União.
Transferência de não índios: o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) é o responsável pelos processos de retirada de possíveis ocupantes não indígenas, indenização de benfeitorias “de boa-fé” e reassentamento dessas pessoas a serem retiradas.

(g1)